Texto: Fonasc.CBH Data:20/12/2016

As audiências tiveram inúmeros participantes. Imagem: Fonasc.CBH

Nos dias 14 e 15 de dezembro de 2016, foram realizadas audiências públicas em Ouro Preto e Mariana, respectivamente, para debater o processo de licenciamento de um novo Sistema de Disposição de Rejeitos da Cava Alegria Sul, localizada nas proximidades da Barragem de Fundão. Esta barragem foi rompida em 5 de novembro de 2015, resultando no maior desastre ambiental da história brasileira e o maior causado pela mineração.

As audiências ocorreram sob um rigoroso esquema de segurança, contando com a participação de aproximadamente 1200 pessoas em Ouro Preto e 1500 em Mariana. Notavelmente, houve ausência dos principais atingidos pelo desastre: os moradores de Bento Rodrigues, Paracatu de Baixo e Barra Longa, povoados que sofreram os maiores impactos com o desastre no vale do rio Gualaxo do Norte (na bacia do Alto Rio Doce).

Representantes do Fonasc.CBH durante audiência. Imagem: Fonasc.CBH. 

FONASC.CBH SOLICITOU AS AUDIÊNCIAS

O Fonasc.CBH solicitou a realização das audiências públicas quando o governo de Minas Gerais publicou o edital em junho deste ano, no qual a Samarco apresentou os estudos de impacto ambiental para o licenciamento da Cava Alegria Sul. O objetivo foi contestar a pressa da mineradora em retomar suas atividades sem ter promovido a devida recuperação ambiental na região mais afetada pelo desastre, além de questionar um licenciamento fragmentado do complexo minerário na região, incluindo três minerodutos, cujas licenças estão suspensas.

Na semana das audiências, completaram-se 400 dias do rompimento da Barragem de Fundão, durante os quais as medidas reparatórias foram precárias e pouco eficazes por parte dos responsáveis pelo crime ambiental, conforme comprovado nos relatórios Hélios e Argos da Operação Áugias/Ibama.

Durante as audiências, foram apresentadas análises por parte da professora e advogada Tatiana Ribeiro, do Grupo de Estudos e Pesquisas Socioambientais da Universidade Federal de Ouro Preto (GEPSA/UFOP), e do ambientalista Gustavo Gazzinelli, evidenciando deficiências no Estudo de Impacto Ambiental (EIA) do novo projeto, e contestando a suposta transparência e seriedade da Samarco e suas controladoras, Vale S.A. e BHP Billiton.

“Esse licenciamento não é suficiente para que a retomada seja feita com segurança. O licenciamento deveria ser feito no complexo como um todo. Por isso, eu entendo que este licenciamento é irregular, porque ele não analisa o complexo como um todo e, por isso, coloca em risco, mais uma vez, comunidades que estão próximas deste empreendimento, no Rio Piracicaba”, disse a professora Tatiana.

O PLANO DA SAMARCO

As audiências públicas foram realizadas pelo Estado para apresentar à população o plano de aproveitamento de uma cava quase exaurida (a cava de Alegria Sul), como depósito de novos rejeitos para a retomada das operações da Samarco. Localizada em área do território de Ouro Preto, limítrofe com Mariana, a cava pertence ao complexo de Germano, onde estava localizada a barragem de Fundão.

A Ação Civil Pública do Ministério Público de Minas Gerais (conforme documento abaixo), o Fonasc.CBH e o Movimento pelas Serras e Águas de Minas/MovSAM argumentam que, com o licenciamento da nova barragem Alegria Sul, a Samarco tenta obstruir a retirada da lama decorrente do rompimento de Fundão, a qual deveria ser removida precisamente para esta cava.

Um forte esquema de segurança foi montando para as audiências. Imagem: Fonasc.CBH.

DISCRIMINAÇÃO DOS ANTIGOS X CLAMOR PELA RETOMADA DA SAMARCO

Quando a audiência foi aberta à participação social, predominou o discurso de que a economia da região está desacelerada, que as pessoas desempregadas necessitam voltar aos postos de trabalho e que, apesar do que aconteceu, a atividade mineradora é fundamental para a região. Além disso, argumentou-se que a decisão sobre o retorno da empresa deveria caber exclusivamente à decisão dos municípios de Mariana e Ouro Preto.

A mineradora Samarco, órgãos públicos e fornecedores da empresa têm promovido um esquema de forte pressão sobre as comunidades atingidas, buscando sua invisibilização e instilando temor, reforçados pela discriminação social que se estabeleceu em Mariana. Esta discriminação parece culpar os atingidos pelo desastre e pelo desemprego que afeta a região.

A imprensa relatou casos de bullying contra crianças atingidas em escolas públicas de Mariana, enquanto as autoridades municipais e estaduais se omitem na proteção das comunidades vulneráveis, também atingidas, agora sujeitas a um verdadeiro Estado de Exceção imposto. A Samarco organizou encontros com as comunidades e audiências, mobilizando aqueles que compareceram em massa para defendê-la, destacando sua “seriedade”, “transparência” e “competência”, como se o desastre de Fundão fosse resultado de um erro humano isolado, e não de uma série de falhas, como foi evidenciado na denúncia do Ministério Público Federal aceita pela Justiça.

O Fonasc.CBH e outras organizações socioambientais presentes, que monitoram a atuação das grandes mineradoras e as políticas ambientais e de recursos hídricos em Minas Gerais e no país, procuraram destacar as fragilidades e inconsistências do projeto. Este, além de se limitar aos próximos dois anos sem definir claramente os anos seguintes, poderá servir de pretexto para que a Samarco enterre definitivamente Bento Rodrigues e mantenha os rejeitos do rompimento nos vales dos rios Gualaxo do Norte e Carmo.

Veja aqui fotos, vídeos e documentos sobre as audiências públicas.

Documento do Ministério Público – ACP – MPMG 30NOV2016 – REMOÇÃO DE LAMA MARIANA

Tréplica do Fonasc – final da AP da Samarco em Mariana-MG 15dez2016